sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

ENGRAXATES NA PRAÇA DA INGLATERRA


Valci Barreto

Editor do bikebook.blogspot.com
Colaborador do muraldebugarin.com

Tênis, sapato de plástico, asfalto, novos costumes, afastaram os engraxates das paisagens urbanas. Mas em alguns cantinhos eles ainda resistem.

Um destes, na cidade do Salvador, é um pequeno espaço da Praça da Inglaterra, no Comércio, Centro.

Mas os que conheci são bem mais do que engraxates/sapateiros. São animadores de pessoas. Enquanto engraxam, vão contando estórias, fazendo crítica de filmes , música , brincando com os amigos passantes, falando a sabedoria da praça. Moram em bairros afastados, mas ali se juntaram na luta pela sobrevivência, organizaram-se e eles mesmos escolheram uma farda para se apresentarem como sapateiros/engraxates.

Andando de moto, meus sapatos sujam mais do que o habitual; e a profissão que escolhi, ou que me escolheu, ainda não combina com o uso do tênis e sandálias havaianas que tanto me aliviam nos finais de semana. Por isto, aproveito um tempinho do trabalho para, vez em quando, ali engraxar os meus sapatos. Mas ainda não havia tido a oportunidade de ter “um dedo de prosa” com qualquer um deles. Na última sexta, no entanto, além de ter juntado mais engraxates/sapateiros no local, a conversa estava muito animada entre eles. O elevado grau de bom humor e as brincadeiras que faziam entre si foram me contagiando, “impondo”-me o desejo de ouvi-los e perguntar algumas coisas sobre as suas vidas. Poucas conversa, mas o suficiente para trazer-me muitas reflexões. Alegrou-me tudo que aconteceu naqueles poucos minutos. Nem lembrei que estava ali, tão sòmente, para engraxar meus sapatos. Gostei do trabalho deles e da nova amizade que , tenho certeza, adquiri. Serei mais assíduo
Perguntei o nome de cada um. Surpreso com as respostas, sorri e perguntei se poderia , com aqueles “nomes” , apresentar aos meus amigos. Sendo positiva a resposta, e com muita convicção, anotei seus nomes para fornecer aos nossos leitores. Foram mais adiante, dizendo que gostavam deles.

Confiem seus sapatos àquela turma. E a sua alma. Demorem mais. Se assim fizerem saírão com os sapatos mais limpos; e, de quebra, da mesma forma , a cabeça. Pelo menos foi assim comigo. Se não acontecer com mais alguém, certamente ainda não escutaram o poeta Jorge Luiz Borges, arrependido por não sido menos "responsável " antes dos 80 anos. Se alguem dali saí apenas com os sapatos limpos, algo de errado está no dono. Jamais nos engraxates. Esqueci até a zanga que me atormentava por ter que pagar iptu, telefone. Paguei até com uma certa alegria. Só adiei a que tenho com o Tempo, que ninguém consegue pagar, nem mesmo dando toda a razão do mundo para o poeta Argentino.

A foto da turma está em “galeria de fotos”, no muraldebugarin.com.

Os nomes deles, o que conversaram? Você mesmo pergunta: É um bom começo para uma grande alegria, se voce lembrar de Fernando Pessoa, em um dos seus mais belos poemas.

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