quinta-feira, 29 de novembro de 2007

JABUTI VAGAROSO DE 24.11.2007



-valci Barreto
Jabuti Solitário de 24.11.2007.



Valci Barreto

Editor do bikebook.blogspot.com
Do meu zine, link do mesmo site
Colaborador do muraldebugarin.com





Com o social de ontem, não poderia marcar hora de saída para o Jabuti de hoje. Acordei às 07. Pedindo o corpo um pouquinho mais de cama, com controle de tv na mão, assisto ao Panorama Rural, Irmãos Caminhoneiro , Globo Rural; este apresentando uma excelente reportagem sobre a pisada do cavalo colombiano .Levantei e cumpri as tarefas" burocráticas" de todos os dias: banho, dentes, café, meia, tênis, camiseta, arrumação dos apetrechos para a saída de bike.

Todo pronto para a descida, olho o relógio e estabeleço: 40 minutos de leitura de A MONTANHA MAGICA, de Thomas Mann, da Coleção Grandes Romances, 4a Edição, Tradução e Herbert Caro, Editora nova Fronteira , de 1980.

Cumpridos os 40 minutos de leitura, desço o elevador para o início da pedalada. Apanho uma das minhas bikes para empurrá-la até o posto de gasolina da frente do Vitória Center a fim encher os seus pneus. Após, sigo em direção ao Dique do Tororó onde grupos de capoeira e de caminhadas do movimento negro se acomodavam embaixo de árvores e do viaduto para se proteger de um chuvisco que se iniciava. Vou seguindo, encontrando em todos os cantos que passava muita gente vestindo as cores do Bahia para o grande jogo de hoje. Na frente do estádio, muitos ônibus de turismo parados que certamente conduziram torcedores de toda a Bahia para a grande festa.

Estava a Djalma Dutra com o comércio parcialmente aberto e a feira do Mercado da Sete Portas bem movimentada. Alguns ônibus e tax passavam buzinando com seus gritos de guerra: “sai da frente que aqui não é pista de bicicleta.” “sai da frente que esta rua é só minha”.

Acreditando que, mesmo morrendo de vontade de me atropelar, eles preferem apenas assustar, vou seguindo pela Baixa do Sapateiro. Na esquina de acesso ao Pelourinho encontro meu colega Mozart Moreira que vinha da missa do Pelourinho com Adé , sua esposa e paramos para o abraço e os “festejos” típicos destas agradáveis encontros inesperados de amigos.

Subo empurrando a minha magrelae observando a Igreja do Pelô cheia de fiéis, baianas enfeitadas na porta e um grupo do SALVADOR FOTO CLUBE fotografando, como sempre fazem, tudo que se apresentavam ao seus olhares, inclusive o “out bike door”, de madeira da minha bicicleta, cuja imagem certamente fará parte da exposição que realizam após os seus passeios fotográficos.

Não entrei na igreja porque estava muito suado. Mas ouvia o sermão quer dizia respeito às ações afirmativas e história dos negros. Do lado de fora as conversas e brincadeiras tratavam do jogo do Bahia que aconteceria mais tarde na Fonte Nova.

Os pinguinhos , ensaios refrescante de chuva “ajudavam”-me a subir a “ladeira do pelô” sem maiores sacrifícios, empurrando minha bici, sob o olhar dos turistas que já começaram a chegar para o verão baiano , assediados pelos vendedores de fitinhas, rosários e bugigangas do artesanato baiano.

Em uma loja de CD, na Sé, ouço, bem sintonizada, a voz macia, inconfundível, de João Gilberto perseguida naquele momento por um “sonzão”, da loja vizinha.

Vou seguindo, parando em frente à Câmara Municipal para conhecer o nosso primeiro bicicletário, implantado pelo seu Presidente Valdenor Cardoso, cuja inauguração acontecerá na próxima sexta feira, dia 30.11.2007.

Gostei do bicicletário. Era como eu pensava que deveria ser:simples, sem maiores custos e em local muito apropriado. Fiz a “inauguração particular, amarrando nele a minha magrela , dirigindo-me em seguida para um sorvete na Cubana. Tive a sorte de procurar a carteira antes de pedir o sorvete. Só assim descobri que saíra de casa sem um centavo!

Dei uma parada para olhar os barcos acomodados na Marina, os telhados que ainda restam do nosso casario do comércio, o movimento das barracas da frente do Mercado Modelo, para, em seguida, dar uma volta nas barracas instaladas no “Cemitério de Sucupira”.

Com a sensação de ter inaugurado o bicicletário, apanho minha magrela e vou ao próximo destino: Museu da Caixa Econômica, que no momento abriga duas exposições “PORTINARI NA COLEÇÃO CASTRO MAYA” e A GRANDE ARCA: Arte da Fé, do fotógrafo Edgar Oliva, com fotografias de presépios feitos por pessoas simples de várias cidades da Chapada Diamatina, “que falam per si;imprimem, através de seus autores, a força e a fé da natureza humana no âmbito da crença religiosa e da sociedade em que vivem," nas palavras do catálogo distribuido aos visitantes. Abriga ainda a exposição um presépio, instalado no mesmo modelo dos fotografados.

Na exposição fotográfica duas artes se misturam: a dos presépios e a da Fotografia em belas e coloridas imagens. Logo na entrada, uma moça me atende com um sorriso radiante propondo-se a me prestar informações e indicando os católogos das exposições. Subo as escadas e me apresento a um novo facilitador que portava um livro de Esra Pond. Não tendo dúvida de que se tratava de alguém que gosta de ler, provoco -o com a “original” pergunta: "Gosta de ler, não é?" " Estuda o que? "
-Sou Rafael, estudante de Letras , com Inglês, da UNEB; e sou apaixonado por livros. Meio sorridente, continua: “sou um mini bibliófilo." Após “ocupar “ Rafael, conversando sobre livros, apresento-me , relatando nossas atividades cicloativistas. Afirmou Rafel que soube de um programa de Tv que apresentou uma reportagem de um ciclista apaixonado por livro e que fazia passeios para doações a bibliotecas comunitárias. Afirmando para Rafeal que ele estáva diante do próprio, rimos juntos e deixamos no ar certeza de que teremos futuras conversas e ações sobre livro. Na certeza de que isto vai acontecer vai acontecer, afirmo para o Rafael que se continuássemos naquela conversa, eu não iria ver a exposição e ele não iria podere mais atender aos visitantes do Museu...

Percebi que a bicicleta ainda não o tocou. Mas acho que é uma questão de tempo. “Vamos fazer a sociedade dos DOIS MINI BIBLIÓFILOS DA BAHIA”, brinquei, relacionando a minha afirmação com “Sociedade dos Cem Bibliofilos” parte do tema da exposição Castro Maya.

Começa a minha visita limitada por não estar ali meu amigo George, Itaninha, Luzia, Lazaro , que curtem o Juabuti Cultural;

Meu olhar vai passeando por edições raras de Machado de Assis, José Lins do Rego, fotos, gravuras ,desenhos; ilustrações de Candido Portinari, para várias edições de obras como Don Quixote, O Alienista, Dom Casmurro; fotos de Juscelino e Getulio Vargas com o colecionador , bibliófilo e industrial Maya, e Portinari.

Sigo o caminho traçado pelo da escrita, da foto, da imagem e da literatura que deixam as suas marcas de eternidade para nossas contemplações , vivencias e emoções.

Retorno para o térreo, para a outra missão, no mesmo museu: Visita a exposição fotográfica reveladora da magia singela da arte dos presépios.Nesta , duas artes se uniram : a da fotografia e as manifestações do povo humilde da Chapada Diamantina.

Despeço-me da equipe do museu, premiado pelo que vi , e retorno para casa.

No trajeto, entro na Casa da Itália para uma saudação à turma do Bocce que naquele momento jogava uma animada partida. Saudações feitas, e promessas para jogar em um próximo domingo, sigo em frente. No Forte de São Pedro, no cruzamento de acesso à Contorno, na Sinaleira, soldados, equipes de socorro, vidros quebrados, carros parados e uma senhora sendo resgatada para o hospital, resultado de uma batida entre dois veículos e de um atropelamento.

Pois é, carros batidos , uma senhora atropelada e na mesma pista veiculos passando em velocidade incompatível com o local, com enormes bandeiras de pau ou de plásticos, esticadas para fora, igorando o perigo, mesmo tendo aos seus olhos a cena do atropelo.

As investigações vão dizer o que aconteceu. Mas , com a visão superficial a mim permitida, ali, naquele local, um dia de domingo, de pouco movimento jamais se poderia pensar na ocorrência de um acidente senão como conseqüência da falta de respeito, educação e cuidado de algum ou de todos os envolvidos.

Resgatada a senhora, vou seguido. No Campo Grande, muitos trios elétricos se preparando para o DIA DO SAMBA, alguns testando o som “batendo firme” nos ouvidos de quem passava ou descansava.

Desço a ladeira da Barra. Um motorista da empresa Ondina me espreme na pista, buzinando com o seu jeito mal educado de dirigir. Acreditando que queria apenas me assustar, vou seguindo expremendo-me nos cantos da pista para ele passar. Logo atrás vem outro ônibus da mesma empresa e sou compensado pela atitude deste que dirigia com o maior cuidado e respeito ao meu pedal. No momento próprio guinei para a direita, em local seguro e manifestei, em acenos, meus agradecimentos pela gentileza , educação e respeito manifestado.

O primeiro motorista ainda não aprendeu a lição que o segundo já lhe pode ministrar.

Alcanço o Porto da Barra com seus barcos, gente correndo, caminhando, os bares cheios, tempo meio tristinho, ruas lavadas pela chuva e todo o seu universo de pessoas, cores e muito frescor em seu vento. Entro no Caranguejo do Farol para cumprimentar meu amigo Helio Macedo, ao som do Aguinaldo Santana, artista que ali vem se apresentando aos domingos. E não poderia ser outra a música naquele momento, para um JABUTI:

“Ando devagar por que já tive pressa e levo este sorriso porque já chorei demais”. Obrigado , Agnaldo!

Despeço - me e continuo o pedal com a imensa vontade de ir "tocando em frente. Mas faço a curva em direção à minha casa, encontrando-me ainda com ANNA GEORGINA, da PANORAMA GALERIA DE ARTE, que pára seu carro para perguntar:

-Valci, já marcou a data?

Referia-se à Exposição sobre o tema BICICLETA, segunda edição, que está sendo cobrada pelos artistas , ciclistas e até por órgãos de turismo da Bahia.

Respondo-lhe: O papel dos artistas é fazer as artes, o seu é marcar a data. O nosso é só avisar e participar! E arremato:

Pode marcar a data . Seja ela qual for estaremos lá!

E avisem aos artistas: A de 2009 terá seu tema amplicado para LIVRO E BICICLETA, igualzinho ao pedal de hoje.

Chego em casa com a alma lavada. Nem me lembrava que fiz todo o passeio sem um centavo no bolso!


(Lamentável, apenas, o que aconteceu depois:a trajédia ocorrida na Fonte Nova, quando 7 pessoas morreram e outras ficaram feridas."


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